terça-feira, 10 de agosto de 2010

A pandora de Lula

A mitologia grega conta que uma caixa contendo todos os males da humanidade foi dada pelos Deuses a Epimeteu, sob a condição que jamais a abrisse. Porém, sua mulher, Pandora, não resistiu à curiosidade e abriu-a, deixando escapar todos os males. Do grego, Pandora significa “aquela que tudo dá” ou “a que possui tudo”.
Fazendo uma analogia com o governo e sua candidata, Dilma, podemos perfeitamente comparar o sentido desta lenda com o que acontece nos bastidores da sucessão e o que representa a candidata do “mito” Lula. A diferença, porém, é que no governo a caixa já foi aberta e os males já escaparam. Certamente muitos não irão concordar, principalmente aqueles que estão sendo beneficiados com a pujança econômica, com a ilusão do crédito barato, com as oportunidades e o corporativismo no serviço público, com o bolsa-família (cuja maioria, infelizmente, não vai ler este artigo) e aqueles que, como eu, foram enganados ao acreditar que um governo de esquerda poderia ser ético, honesto e reformador.
Enfim, todos aqueles que acreditam que o Estado existe não para regular, servir e educar, como seria numa nação madura e civilizada. Assim como Pandora, que tudo dá e se apodera, a maioria prefere o Estado-governo paternal e onipotente, que irá conduzir suas vidas e resolver seus problemas. Isso vale para os ricos e os pobres. Os ricos, que se servem da corrupção e do clientelismo no serviço público. Os pobres que, motivados pela falta de perspectiva causada pela deseducação e a ignorância, preferem contar com o assistencialismo estatal. Todavia, os principais “males” do governo não são estes. Talvez eles continuem seja Serra ou Marina o vencedor. O pior mal que está por vir é quase imperceptível para a maioria dos brasileiros: a tomada do Estado por algumas pessoas que não tem o menor respeito pelas instituições, pelas leis de mercado, pela gestão isenta e moral no serviço público, pela ética nas relações sociais e políticas. Os acontecimentos e a história recente do governo Lula comprovam isso e os sinais são evidentes. Infelizmente, estamos sendo ofuscados pela bonança econômica e pela sensação de estarmos vivendo um novo “milagre”, creditando os méritos somente ao governo e ao “Deus Lula” e nada aos altos impostos, à livre iniciativa e à vocação primário-exportadora nacional. Tudo está limpo enquanto a sujeira se esconde sob o tapete. A percepção da maioria é egoísta e despolitizada e não vê a democracia como um instrumento de alternância nos poderes e de competitividade social e econômica.
Deste modo, será que podemos confiar num governo que adota uma política externa ideológica, que negocia com ditadores e apóia suas políticas? Queremos um Estado inchado e gastador, que sangra o erário com ONGs duvidosas e que toma para si a responsabilidade de gerar riqueza e criar empregos? Queremos um serviço público “aparelhado” por pessoas que nada tem a ver com o público e desejam o poder perpétuo? Queremos a volta do José Dirceu, dos Delúbios e dos dólares na cueca? Os grampos, falsos-dossiês etc. e outras práticas fascistas de conquistar o poder? Alguns vão pensar que todos os governos são assim: todos roubam, corrompem, são perdulários e que não há o que fazer. Entretanto, na lenda de Pandora foi conservado um único bem para combater os males: a esperança. Não a “esperança que venceu o medo” de Lula, mas a esperança de que, pelo voto, poderemos “fechar a caixa” e interferir no destino do país, fazendo uma escolha racional, responsável e solidária com a melhor proposta para o nosso futuro. (Gilmar Viriato Santos é economista e especialista em Gestão Pública - gviriato@uol.com.br)